
Bruna Black, Hodari, Jonathan Ferr, Jota.Pê, Luccas Carlos e Melly abordam 12 músicas do compositor em álbum em que, entre sucessos e dois lados B do artista, os cantores brilham mais do que os arranjos. Bruna Black (no alto, á direita), Hodari (no alto, ao centro), Jonathan Ferr (no centro, embaixo), Jota.Pê (embaixo, à direita), Luccas Carlos (embaixo, à esquerda) e Melly (no alto, à esquerda) formam o elenco do tributo a Djavan
Pedro Figueiredo / Montagem g1
♫ OPINIÃO SOBRE DISCO
Título: Canto Djavan
Artistas: Bruna Black, Hodari, Jonathan Ferr, Jota.Pê, Luccas Carlos e Melly
Cotação: ★ ★ ★ 1/2
♬ Cantar a música de Djavan é pisar em casca de banana. É grande o risco de o intérprete escorregar, caindo na seara do cover e/ou diluindo a riqueza harmônica que molda a obra do compositor alagoano, um dos gigantes da MPB. Tributo fonográfico lançado às 21h de ontem, 10 de julho, Canto Djavan tem o mérito de se desviar do lugar-comum do barzinho.
O jovem e talentoso elenco do selo slap – formado por Bruna Black, Hodari, Jonathan Ferr, Jota.Pê, Luccas Carlos e Melly – imprime a própria assinatura vocal no álbum gravado com produção musical e arranjos de Uiliam Pimenta (beats, programações, teclados, Rhodes, Hammond e piano acústico), Julio Raposo (beats, programações, teclados, Rhodes, violão e guitarra) e Pepê Santos, sob direção artística de Max Pierre.
A rigor, nenhuma das 12 abordagens do disco – cada intérprete dá voz a duas músicas – salta aos ouvidos como gravação capaz de desafiar a barreira do tempo. Mas todos oferecem uma visão particular da obra sem tentar imitar Djavan. Em bom português: ninguém passa vergonha como o elenco dos recentes constrangedores tributos a Cazuza (1958 – 1990) e Rita Lee (1947 – 2023), O poeta vive (2023) e Revisita Rita (2025), respectivamente.
Jota.Pê abre o álbum com o canto grave de Açaí (1981) distante do tom mais expansivo da gravação de Gal Costa (1945 – 2022). Mais tarde, o cantor paulista move o dom do canto para tentar atingir o âmago de Seduzir (1981) enquanto cai no suingue à medida em que a gravação avança.
Em comum, o elenco do álbum Canto Djavan tem o livre trânsito por gêneros da música negra norte-americana como o soul e o R&B contemporâneo. É com o aconchego black que Melly, por exemplo, se agasalha para amenizar o frio da saudade do amor distante que tempera a canção Nem um dia (1996).
Cantora baiana, Melly também revisita Tenha calma (1989), única música escrita por Djavan sob ótica feminina. Com refrão que envelheceu mal por propagar a submissão feminina na relação afetiva, Tenha calma é música pouco abordada do compositor, tendo sido lançada por Maria Bethânia no álbum Memória da pele (1989).
Voz carioca do R&B, o cantor Luccas Carlos atravessa o deserto escuro para fugir da solidão imersa em Aridez (2015), lado B do compositor. Aridez somente foi gravada por Djavan no álbum Vidas pra contar (2015), lançado há dez anos. Já Azul (1982), canção solar que ganha tom black no canto do mesmo Luccas Carlos, tem como referência nacional o canto matricial de Gal Costa em gravação do álbum Minha voz (1982).
Capa do álbum ‘Canto Djavan’, de Bruna Black, Hodari, Jonathan Ferr, Jota.Pê, Luccas Carlos e Melly
Pedro Figueiredo
Cantora paulista, Bruna Black amacia o canto na cadência manda do xote que impulsiona Ventos do norte (1976), música de acento nordestino que ficou escondida entre os sambas do primeiro álbum de Djavan. Coube também a Bruna Black dar voz à balada Um amor puro (1999) em tonalidade mais íntima.
Nascido e criado em Brasília (DF), Hodari sobressai com envolvente registro de Cigano (1989) em gravação que evidencia o apego dos produtores e arranjadores do disco aos beats e programações. Hodari também é o intérprete de Samurai (1982) em gravação que cai em suingue próprio sem se distanciar realmente do incontornável registro original feito por Djavan no álbum Luz (1982).
Projetado como pianista de heterodoxo toque jazzístico, Jonathan Ferr solta a voz com naturalidade na música mais desconhecida do repertório (ao lado da já mencionada Aridez). Trata-se de Adorava me ver como seu (2007), música até então esquecida no álbum Matizes (2007) que se impõe como um dos grandes momentos do tributo e que se afina com a origem do artista pela citação do Madureira, time de futebol do homônimo bairro carioca em que Ferr foi criado.
Ferr também põe a voz a serviço do canto da balada Pétala (1982), esta refém inevitável da comparação com a gravação original de Djavan. Detalhe: Jonathan Ferr toca piano acústico e Fender Rhodes nas duas faixas.
No todo, os cantores soam melhores do que os arranjos do álbum Canto Djavan, mas é justo ressaltar que o tributo deixa boa impressão. Ninguém canta Djavan como se estivesse em um barzinho em busca do coro da audiência.