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Assim que o filho Lucas nasceu, a diarista Bruna Guimarães, de 29 anos, o colocou na fila de espera por uma vaga de creche em Mauá, na região metropolitana de SP, onde moram. Apenas em fevereiro deste ano, Lucas conseguiu uma vaga de tempo integral, o que permitiu que Bruna voltasse a trabalhar após mais de 2 anos parada.
Eu deixo ele na creche e vou para onde tenho a diária, mas dependo da minha mãe para buscar o Lucas na escolinha, porque geralmente só chego em casa depois das 18h.
A falta de creche comprometeu a renda da família de Bruna. Durante o tempo que ficou sem trabalhar, ela deixou de receber cerca de R$ 2,5 mil por mês para cuidar do filho. A família, então, passou a sobreviver apenas com o salário do marido dela.
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Assim como aconteceu com a mauaense, muitas famílias enfrentam dificuldades para conseguir uma vaga de creche para os filhos. Mesmo que a etapa não seja obrigatória, o impacto é grande na renda das famílias e no desenvolvimento das crianças.
Um levantamento do Todos Pela Educação com base em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD-C) e do Censo Escolar divulgada nesta segundap-feira (11) revelou que quase 2,3 milhões de crianças de até 3 anos estão fora da creche por dificuldade de acesso.
O dado fica ainda mais alarmante quando observado por divisões de quintil de renda — quando a população é dividida em cinco grupos que consideram a distribuição de renda, de 20% a 20%. Neste caso, fica evidente que quanto mais pobre é a família, mais dificuldade ela tem em acessar a educação infantil.
Motivo de não frequentar a creche para crianças de 0 a 3 anos.
Arte: Thalita Ferraz/g1
“A necessidade ou interesse por atendimento de crianças de 0 a 3 anos é relativamente semelhante nos diferentes níveis de renda, mas os mais pobres têm maior dificuldade de ter sua demanda atendida”, conclui o levantamento.
Frequentar creche é benéfico
Crianças em creche.
Paulo H. Carvalho/Agência Brasília
Gabriel Corrêa, diretor de Políticas Públicas do Todos, reforça que a etapa da educação infantil, que engloba creche e rapé-escola, não é obrigatória, mas é muito benéfica para as crianças.
As crianças que não têm acesso à educação infantil são privadas de ter um ambiente seguro que estimule o seu desenvolvimento e interação com adultos que estão ali com plena atenção, preparados para estimular o desenvolvimento das crianças.
Além disso, estudos apontam que crianças que frequentam a educação infantil são mais propensas a terem uma trajetória escolar de sucesso.
Em contrapartida, crianças que não frequentam a etapa escolar podem enfrentar:
maior dificuldade no processo de alfabetização,
mais chances de ter atrasos de aprendizado e de desenvolvimento no ambiente escolar,
maior dificuldade de concluir a educação básica,
dificuldade de ingressar no ensino superior, e
dificuldade de ingressar no mercado de trabalho.
‘São necessárias políticas específicas’
Na última terça-feira (5), o presidente Lula (PT) assinou o decreto que cria a Política Nacional Integrada para a Primeira Infância (PNIPI).
A iniciativa será coordenada pelo Ministério da Educação (MEC) e prevê a integração de diferentes áreas do governo para reunir informações das crianças de 0 a 6 anos. A PNIPI também deve ajudar na definição de políticas públicas que visem melhorar a qualidade de vida da criança e de suas famílias considerando diversos aspectos sociais.
Além disso, está em discussão no Congresso Nacional a definição de novas metas para o Plano Nacional de Educação (PNE) — que guia as estratégias e objetivos para a educação para os próximos 10 anos — que pode estabelecer uma meta de garantir a matrícula de até 60% das crianças de até 3 anos.
No último ciclo, que terminou em 2024, a meta era de 50%, mas o atendimento ficou em 41,2%, de acordo com o Todos Pela Educação.
Com as discussões alimentadas pelas novas políticas, Gabriel Corrêa acredita que é um momento propício para determinar planos de ação que priorizem a expansão de vagas para as famílias que têm maior dificuldade para garantir uma vaga.
O que vem acontecendo no Brasil, e os dados mostram isso, é que o atendimento tem se expandido de forma muito mais rápida para as famílias mais ricas. Essas famílias conseguem pagar uma escola particular ou estão em regiões das grandes cidades onde é mais fácil essa expansão do acesso.
Com as limitações das famílias mais pobres que não têm as mesmas oportunidades, o especialista avalia que o poder publico faça:
Mapeamento da demanda: para entender onde estão as famílias que mais precisam de creche.
Plano de expansão das vagas: que vise a equidade no acesso e a expansão das vagas em bairros mais afastados dos centros.
“Afinal, o atendimento em em creche e em pré-escola é um direito de todas as crianças, de todas as famílias. Está estabelecido na na Constituição Federal e é um serviço muito importante para o desenvolvimento infantil, independente da classe ou renda”, conclui o especialista.
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