Casal que viveu 43 anos junto morre com diferença de menos de duas horas


Sebastião e Almezinda de Abreu morreram com menos de duas horas de diferença, após 43 anos de união
Tiago Abreu/Arquivo Pessoal
Uma história de amor que atravessou décadas chegou ao fim, ou talvez a um novo começo, em São João del Rei, no interior de Minas Gerais. Casados há 43 anos, Sebastião Francisco de Abreu, de 72 anos, e Almezinda Maria da Fonseca de Abreu, de 70, morreram com menos de duas horas de diferença.
Para os filhos, a separação física nunca foi uma opção na vida deles. “Quando o coração do meu pai parou, parece que o da minha mãe também parou junto. Parece que ele saiu dali só para buscar ela”, contou Tiago Abreu ao g1, um dos dois filhos do casal.
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Sebastião enfrentava problemas de saúde há mais de um ano. Em 2024, passou por uma cirurgia após fraturar a cabeça do fêmur, um osso da coxa. A recuperação foi longa e exigiu fisioterapia constante.
Nos últimos 40 dias, ele esteve internado por conta de uma infecção urinária e, posteriormente, uma pneumonia, agravadas pela insuficiência cardíaca. Almezinda esteve ao lado dele o tempo todo, como sempre fizeram ao longo da vida.
“Ela ficou com ele todos esses dias no hospital. A gente tentava trocar, mas ela não aceitava. Ele também não queria que fosse outra pessoa. Ele dizia que ela era a médica dele”, lembra Tiago.
O amor entre eles era do tipo que não aceita separações, nem temporárias. Na manhã da última quarta-feira (20), Sebastião piorou.
“Minha mãe me mandou um áudio chorando, pedindo para eu descer para o hospital, porque ele não estava bem. Quando cheguei, ela já estava mal também. Sabia o que estava por vir. Ela conhecia os procedimentos do hospital, já tinha visto outras pessoas partirem”, conta o filho.
Com muito esforço, a família convenceu Almezinda a ir até a casa de uma tia para descansar um pouco. “Ela já saiu de lá dizendo que não ia aguentar ficar sem ele. Disse com todas as letras que ia encontrá-lo. Era como se ela já soubesse que não viveria sem meu pai”.
Mais tarde, naquela mesma noite, por volta das 23h, Sebastião faleceu na Santa Casa de São João del Rei. Pouco depois, a família foi surpreendida por uma ligação: Almezinda também estava na UPA, após sofrer um ataque cardiogênico fulminante, como se tivesse o coração partido e fosse acompanhar o marido na morte.
Segundo Tiago, ela não tinha histórico de problemas de saúde e também não soube da morte do marido.
Até o fim
Casal que morreu com horas de diferença em MG
Tiago Abreu/Arquivo Pessoal
Na despedida no funeral, a união dos dois foi ainda mais evidente. Os filhos tentaram organizar o sepultamento em duas gavetas lado a lado, mas no cemitério havia somente uma gaveta e um túmulo no chão.
“A gente não teve dúvida: os dois seriam enterrados juntos, na mesma sepultura no chão. Não tinha como separar. Nunca foram separados. Nem deveriam ser agora”.
O velório reuniu amigos, vizinhos, religiosos, congadeiros, evangélicos, católicos, moradores em situação de rua e crianças. Todos com histórias de carinho e gratidão por Almezinda e Sebastião. Muitos diziam que eram como pai e mãe para todos.
“Ficamos com saudade, mas não com tristeza. Porque eles viveram e morreram do jeito que escolheram: juntos, em paz, com fé. E deixaram um legado que a gente carrega com orgulho”, conclui Tiago.
Amor que nunca se separou
A história de Sebastião e Almezinda começou em uma festa de bairro, ainda na juventude. Desde então, nunca mais se separaram. Tiago conta que nunca viu os pais brigando.
“Tudo era conversado, dividido, feito junto. Minha mãe era mais ativa, mas nada acontecia sem antes ela ouvir meu pai. E ele sempre apoiou tudo que ela fazia”, explicou.
E o que Almezinda fazia era muito. Religiosa, solidária e determinada, dedicava boa parte do tempo a ações voluntárias e festas religiosas, como as celebrações de São Cosme e Damião, Congado, Festa do Divino, Nossa Senhora do Rosário e tantas outras que ajudava a organizar com o mesmo zelo com que cuidava da própria casa.
Era conhecida por todos no Bairro São Dimas e além. As crianças sabiam que poderiam bater à porta dela e sair com pão, leite ou café. Adultos em situação de vulnerabilidade também recebiam acolhimento. Com jeito firme, mas acolhedor, Almezinda virou referência de solidariedade em São João del Rei.
Almezinda de Abreu ajudava muita a comunidade de São João del Rei
Camilla Nascimento/Arquivo pessoal
Sebastião, mais reservado, também carregava fé e empatia. Músico, tocava na igreja e dizia com orgulho que era cursilhista — um cristão católico comprometido a aprofundar a fé e a transformar os ambientes onde vive. “Quando alguém lhe contava algo ruim sobre outra pessoa, ele respondia apenas: ‘Reza por ela’”, lembra Tiago.
Com a morte dos pais, Tiago criou uma música para lembrar com carinho deles. Escute abaixo:
Filho transforma luto em canção após morte dos pais em São João del Rei
Na história desse casal, não há espaço para tragédia. Existe um sentimento raro, que resistiu ao tempo, às dificuldades e até à morte. Eles provaram que o verdadeiro amor existe e pode durar para sempre.
*estagiária sob supervisão de Carol Delgado
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