Como funciona o translado de corpos do exterior para o Brasil; relembre casos de famílias que tiveram dificuldade com custos


Lula mudou decreto nesta sexta sobre translado de corpos do exterior liberando que o governo pague despesas. Até então, a União não arcava com custos relacionados a mortes de cidadãos em outros países. Decreto vigente desde 2017 deixava claro que o governo federal não arcava com despesas relacionadas ao sepultamento e traslado
Carlos Henrique Dias/g1
Após a morte da brasileira Juliana Marins, de 26 anos, que caiu de um penhasco na trilha do Monte Rinjani, na Indonésia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) alterou o decreto que impede o governo federal de custear para o Brasil o translado de cidadãos mortos no exterior.
Segundo a nova regra, fatores como dificuldades financeiras e mortes que causam comoção são exceções e podem ser pagas pelo Ministério das Relações Exteriores.
No texto, são caracterizadas como exceções se:
A família comprovar incapacidade financeira para o custeio das despesas com o traslado;
As despesas com o traslado não estiverem cobertas por seguro da pessoa que morreu;
O falecimento ocorrer em circunstâncias que causem comoção; e
Houver disponibilidade orçamentária e financeira.
👉Até então, a legislação sobre as situações em que os cidadãos brasileiros têm direito à assistência consular fora do país estabelecia que o apoio incluía o acompanhamento em casos de acidentes, hospitalização, falecimento e prisão no exterior.
No entanto, a norma deixava claro que o governo federal não arcava com despesas relacionadas ao sepultamento e traslado de corpos de cidadãos falecidos no exterior, nem com custos de hospitalização.
Lula diz que vai mudar regra sobre traslado de corpos do exterior após morte de Juliana Marins na Indonésia
Por conta da legislação até então vigente, muitas famílias de brasileiros que foram encontrados mortos no exterior tiveram que organizar vaquinhas para conseguir bancar o custeio. Relembre alguns casos:
‘Horrível essa busca por dinheiro’
Adriana Vieira foi encontrada morta em Miami, EUA
Reprodução/Instagram
Antonia Lourdes Leite do Nascimento, moradora da capital paulista, é mãe da modelo brasileira Adriana Vieira, de 31 anos, que morreu após ser encontrada desacordada em um porto de Miami, nos Estados Unidos, em setembro de 2024.
Adriana morava nos Estados Unidos desde 2019 e foi achada sem vida após participar de uma festa em um iate. Segundo o site norte-americano The U.S Sun, testemunhas disseram que a modelo saiu para nadar e não foi mais vista.
Na época, Lourdes ressaltou que fazia questão de enterrar o corpo e não cremá-lo. Por isso, criou uma vaquinha para arrecadar em torno de R$ 70 mil para o translado.
“Foi horrível toda essa busca por dinheiro. Demoramos 72 dias para trazer o corpo e enterrar aqui em São Paulo. Eu não tinha condição de pagar, aí fiz a vaquinha e não deu em nada. Arrecadamos R$ 3 mil. Tudo é muito difícil, porque as pessoas têm medo de ajudar, achando que é golpe. Mas aí recebemos ajuda de uma pessoa e enterrei minha filha. Mas até agora não consegui trazer nada dela, de objeto, de lá”, afirmou ao g1.
“Sobre a revogação do decreto, nada mais do que justo isso. Na época eu fui à Defensoria Pública, pedi ajuda para tanta gente e tentei falar até com o presidente, em Brasília. Será muito bom se as famílias tiverem essa ajuda, porque em um susto assim ninguém está preparado”, ressaltou.
‘Estamos pagando a dívida ainda’
Jonathan Oliveira morreu na Rússia aos 23 anos
Reprodução/Instagram
A família do brasileiro Jonathan Oliveira, que morreu aos 23 anos, em agosto de 2024, após cair de um iate em São Petersburgo, na Rússia, disse que até hoje os custos do translado estão sendo pagos.
Jonathan ficou conhecido na internet após viralizar com um vídeo no carnaval de 2017, em São Paulo. Na época, ele tinha 16 anos e foi flagrado dançando a música Break Free, de Ariana Grande, em cima de um ônibus.
“Pedimos [ajuda] e ninguém ajudou. Fizemos dívidas em cartão de crédito de familiares para pagar tudo. Estamos pagando a dívida ainda. Custo muito alto para trazer o corpo. O transporte do corpo e velório deu R$ 37 mil. Só a passagem foi R$ 28 mil. Não espero nada do governo. Se fôssemos esperar, não teria o velório do corpo aqui”, disse Felipe Medeiros, padrasto de Jonathan.
‘Não tivemos assistência’
Mãe aguarda há quase um mês pela liberação do corpo do filho nos EUA
Em 2023, o g1 acompanhou o drama de Isabel Martines por conta da demora na liberação do corpo do filho, Matheus Gaidos, para enterro no Brasil. O brasileiro foi morto a tiros por brincar com o cachorro de um homem na Califórnia, Estados Unidos, em 21 de junho daquele ano.
Matheus trabalhava como entregador de flores, quando encontrou um homem que passeava com animais de estimação acompanhado de uma mulher. Houve uma discussão, e o dono dos animais atirou. Um suspeito foi preso.
A família teve que arcar com todos os custos do translado. Na época, o Itamaraty informou que o Ministério das Relações Exteriores, por meio do Consulado-Geral do Brasil em São Francisco, estava prestando assistência consular aos familiares da vítima.
“Não tivemos assistência. Tivemos que fazer vaquinha para conseguir arcar com tudo. Pedimos muita ajuda, ajuda para todo mundo. Conseguimos o dinheiro e deu tudo certo. Mas foi algo bem difícil. Liberaram o corpo do meu filho depois de 40 dias. Infelizmente a gente não tem suporte quando isso acontece”, afirmou Isabel, ao g1.
Isabel Martines com o filho Matheus Gaidos, de 27 anos
Arquivo Pessoal
Outros casos de mobilização nas redes
Katchucia Drielle Moesch Flores tinha 29 anos
Arquivo Pessoal
Em março deste ano, familiares e amigos da brasileira Katchucia Drielle Moesch Flores, 29 anos, que morreu após acidente de carro no estado de Punjabi, na Índia, passou a pedir ajuda para trazer o corpo da jovem de volta ao Brasil.
A mãe de Katchucia, Rejane Terezinha Moesch, de 61 anos, afirmou ao g1 do Rio Grande do Sul, na época, que ainda não sabia como ia trazer o corpo da filha. Katchucia era esteticista e tinha quatro filhos, com idades entre 2 e 15 anos.
O Ministério das Relações Exteriores afirmou que “o translado dos restos mortais de brasileiros falecidos no exterior é decisão da família e não pode ser custeado com recursos públicos, à luz do § 1º do artigo 257 do decreto 9.199/2017”. Por isso, os parentes fizeram uma campanha com um custo estimado de R$ 150 mil.
Marta Maria de Castro, moradora de Minas Gerais, relatou também sobre a dificuldade para trazer o corpo do filho, Flávio de Castro Sousa, ao Brasil. Ele estava desaparecido desde 26 de novembro e foi encontrado morto em 4 de janeiro, em Paris, na França.
“O cônsul adiantou que as despesas são por conta da família, e eu não tenho condições. Eu ganho pouco, sou aposentada, tenho problemas graves de saúde”, afirmou Marta, na época.
Corpo de fotógrafo brasileiro é encontrado em Paris
A família do cabeleireiro Bryan Ybsen da Costa Camargo, de 30 anos, que foi achado morto em Portugal em 2024, também contou com a ajuda de amigos para custear o translado do corpo até o Brasil.
Bryan se mudou para a Europa quando recebeu uma oportunidade de emprego. Segundo os familiares, ele já estava fora há, pelo menos, três anos.
Campanha virtual de família de Mairinque (SP) arrecadou mais de 90% do valor necessário para trazer corpo de cabelereiro que morreu em Portugal para o Brasil
Reprodução
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